O menor esterco do mundo ou por que a madeira é um fertilizante melhor do que os minérios

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Evoluímos, mas ainda é pouco.  Explico.

Cobrir o solo com matéria orgânica é uma prática que tem se tornado cada vez mais comum na agricultura e difundida para manter a fertilidade e evitar perda de nutrientes por escorrimento superficial da água ou dessecação da vida do solo.

Tal entendimento, entretanto, ainda é raso, visto que mesmo cobrindo o solo a maior parte dos produtores ainda utiliza fertilizantes inorgânicos solúveis. Esses pozinhos e granulados são feitos de minerais prontos para serem diretamente absorvidos pelas plantas, mas justamente por estarem na sua forma mais disponível são também altamente lixiviáveis.

Isso significa que a maior parte deles se solubiliza com a água e vai infiltrando ou sendo lavado até se tornar um problemático poluente nos rios e cursos d´água.

Fertilizantes inorgânicos solúveis vem junto com o pacote “agrotóxicos”. São caros, causam dependência ao produtor, ambientalmente trazem os impactos e buracos de toda atividade minerária, e ainda afetam a microbiota do solo por causarem salinização quando em grande concentração.

Como sabemos, sal demais desidrata qualquer organismo vivo. Dá sede e pode matar. Não seria diferente para as bactérias e fungos que vivem no solo e que são os fatores fundamentais para a fertilidade e crescimento das plantas.

Onde começa a verdadeira fertilidade

Quem é que defende o uso de fertilizantes inorgânicos que pode explicar o fato de que, numa floresta adulta, apesar de em alguns casos não se encontrar na análise de solo minerais disponíveis como fósforo, potássio e nitrogênio, cresçam árvores sem nenhuma deficiência mineral?

É preciso entender que existe um trabalho invisível feito pela microbiota do solo e que tais nutrientes nunca precisariam ser adicionados se a proporção de fungos, bactérias, protozoários, micro artrópodes e nematoides do solo estiver equilibrada.

Bactérias e fungos aeróbios vivem no entorno das raízes das plantas, interessados em absorver os exsudatos que elas excretam.

E o que são esses exsudatos? São os açúcares, aminoácidos e carboidratos formados pelas plantas a partir da absorção de gás carbônico e da energia do Sol. Ou seja, nas palavras da Dra. Elaine Ingham, as plantas formam docinhos e biscoitos para oferecer aos fungos e bactérias.

Até 40% dos que as plantas produzem com a fotossíntese e que resulta nesses compostos gostosos é enviado às raízes para alimentar fungos e bactérias do solo. Mas por que será que as plantas querem tanto esses seres por perto?

As bactérias e fungos tem enzimas para decompor a rocha-mãe e as partículas do solo, sejam elas argilas, areias, ou siltes, extraindo delas os minerais e nutrientes em suas formas solúveis.

Dra Elaine Ingham ensina que qualquer componente mineral do solo contém todos os nutrientes que as plantas necessitam, só que elas não conseguem decompor esses nutrientes para a forma solúvel, que é a necessária para absorverem e que, por isso, o papel dos fungos e bactérias é fundamental.

Para então serem disponibilizados às plantas na cadeia da vida do solo, os minerais decompostos pelas bactérias e fungos precisam ser liberados, e isso significa que eles só estarão prontos depois que forem excretados.

Isto é, os fungos e bactérias precisam ser comidos pelos próximos seres nessa rede alimentar, que são os protozoários, nematoides e micro artrópodes.

O excedente descartado pelos predadores dos fungos e bactérias fica então disponível para as plantas. Ou seja:

 

Os minerais que as plantas absorvem são o “cocô” da microbiota do solo!

 

Vamos a um exemplo: Vamos ver como ocorre a liberação de nitrogênio no solo, nutriente fundamental para a vida das plantas, a partir de fontes orgânicas.

Todo ser vivo é composto por uma relação carbono: nitrogênio. Nas bactérias essa relação é baixa, ou seja, as bactérias precisam para se manter de cerca de 5 elementos de carbono para 1 de nitrogênio. Mas os predadores das bactérias e todos os próximos seres na cadeia da vida precisam de uma relação carbono : nitrogênio muito mais alta.

Os flagelados que irão se alimentar das bactérias no solo, por exemplo, se mantem com uma relação de 30 carbonos para 1 nitrogênio.

Significa que ao “comer” as bactérias, os protozoários, nematoides e micro artrópodes eliminarão o excesso de nitrogênio que não necessitam. Esse processo disponibiliza o nitrogênio para as plantas.

Como é um processo vivo, os nutrientes vão sendo liberados de forma, lenta, gradual e permanente. Não aparecem esses sais disponíveis na análise de solo, mas eles estão lá, armazenados no metabolismo da microbiota do solo.

Fascinante, não? Encher seu solo de nitrogênio na forma de esterco ou fertilizantes petroquímicos, pode lhe dar uma colheita a curto prazo, mas a longo prazo você está causando um boom de bactérias no seu solo. Bactérias se reproduzindo consomem oxigênio, aumentam a temperatura e diminuem o carbono disponível para todos os outros seres da cadeia, que precisam de muito menos nitrogênio para sobreviver e muito mais carbono.

Entretanto, se você adiciona ao seu solo carbono, você oferece material para seres mais complexos que as bactérias: Fungos e outros que necessitam de relações carbono-nitrogênio acima de 20 para 1. Você permite que sua cadeia do solo se complexifique.

Os fungos irão formar ácidos com suas cadeias ramificadas que permitirão guardar nitrogênio ao invés dele ser lixiviado na sua forma solúvel.

É por isso que plantas lenhosas, aquelas que produzem madeira, são melhores adubos que qualquer fertilizante solúvel. Elas são fonte de carbono que é o componente fundamental para toda a cadeia da vida. Um tronco de árvore tem 150 carbonos para 1 nitrogênio, enquanto que uma folha verde ou gramínea tem 30 para 1.

Esse entendimento ainda é novo para a ciência, mas revela que o Brasil dispõe de um excelente banco: madeiras. Não o deixemos queimar!

Sobre

Marina Utsch e Peter Cezar apresentam no Guia de Permacultura os princípios para criar sistemas eficientes e autossuficientes em energia.
Por meio da observação da Natureza é possível reverter o atual estado de degradação em que a EROI (Energia retornada em comparação com a energia investida) na extração dos minerais e combustíveis não renováveis vem baixando de 100:1 para 3:1. Estamos próximos da exaustão?
Na dúvida, o Guia de Permacultura te ajuda a se preparar para os cenários futuros.
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